Menina Maniva

A que veio da mandioca, a parte venenosa, com muita clorofila, que precisa de sete dias para ser digerida. Isso porque não é qualquer um que encara a "pratada": Quente, calórica e pesada. Aparência nada amigável, sabor incomparável.

terça-feira, 1 de julho de 2008

A estética do calor


A coroa do verão já cerca nossos amigos, nossa rotina, nossa sombrinha. Hora de aposentar os guarda-chuvas, escondê-los atrás do armário, afinal, ninguém tem o costume de usá-los para proteger-se do astro maior desse tempo: O sol.
Os ombros a mostra, a costa nua, as saias curtas e chinelos de dedo. A gaveta dos biquínis já foi remexida, já percebe-se que falta comprar um da cor da moda. Ah, nossos modos também se tornam mutantes no calor de Julho. O ar condicionado, a conta de luz, o refrigerante. Água? Sim, muito banho, conta de água mais cara, suor excessivo.
Praças lotadas a qualquer hora, côcos super refrigerados nas barraquinhas de rua. Todos querem refrescar o equívoco dos dias de trabalho, das tensões diárias, dos casos de amor perdidos. Um amor de verão, quem sabe virá, chega de chuvas e trovoadas.
Levanto da cama suada, o verão está sem jeito dentro de mim, mas o calor sempre existiu por aqui. "A estética do Frio", criada pelo músico Vitor Ramil, em seu livro, aponta onde os gaúchos escondem seus modos separatistas, e como a cultura daquela terra fria é encarada de forma diferente dos demais pedaços do Brasil.
A minha estética do calor, aqui em Belém do Pará, não vai virar livro nem canção. Meu calor não chega a motivar contemplações, a não ser, levantar os braços para o minúsculo suspiro de vento que bate de repente.
De baixo do sol, na cidade das mangueiras, é bom encontrar ao meio dia, uma pequena morada mais fria na rua. Ou escolha entrar no clima de alguma loja fria para depois sentir o impacto do bafo do verão ao sair. Abafe os argumentos contra o que faz parte da gente, do que a pele sente, do que as bordas de janelas guardam com tanto esmero. Depois de tantas chuvas, tomaremos banho de mangueira no quintal.
Abrir o peito para essa estética do calor é também reparar se o cabelo está brilhando o suficiente no sol daquele dia, ou se o salto do sapato não está esfolado, se as unhas estão bem feitas, qualquer descuido será notado aos olhos criteriosos do verão.
É também lembrar naquele texto piegas do Pedro Bial, que você ouviu tantas vezes e nunca mais esqueceu o "filtro solar". É proteger não só a pele, mas também a alma, pois agora estamos expostos nas ruas do mundo. Quando chovia ficamos em casa aos domingos. Agora é hora de colocar o bloco na rua calorosamente. A estética de quem "sua" sempre inspira alguma admiração, suor é esforço. O que ecoa é o pingo d'água, soando dentro da gente.
"Soar e suar": palavras com diferenças gramaticais e semelhanças emocionais.
No calor, saio do banheiro já querendo voltar. Queria entender o poder do clima sobre as pessoas. Se tem corpos a mostra, tem energia sendo dispersada, gente se atraindo, gerando mais calor ainda. Tem beijo, sexo e briga ardente. Os amantes fazem rios. Esse calor afasta a melancolia dos tempos chuvosos. Os poetas que gostam da calmaria, não compõe no verão, são contagiados pelo calor e não param para olhar a vida, se fazem presentes nela.
Os sujos vão aos chafarizes, as crianças tomam sorvetes, as janelas das casas estão sempre abertas. Deixa o vento passar, deixa o calor entrar, deixa o verão fazer mais um dia dentro da sala. Isso parece Ramil.
Aqueles que são esteticamente frios, não conseguem congelar as energias. O sol está para todos.
E para finalizar, retoco a maquiagem à prova d'água e não choro mais o inverno passado. O próximo verão será mais quente, acreditam os meteorologistas... E é para ele que me guardo, ou melhor, espero em exposição solar.

A Menina-Maniva não faz bronzeamento artificial. Está em época de fotossíntese.

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