Vagas sensações natalinas e a história do Táxi-trenó
Os dois dias mais festivos de Dezembro : 24 e 25.
Sim, porque neles existem presentes reais, materiais, diferente da perspectiva de felicidade e sucesso em um ano novo, que é uma alegria quase forçada, esmagada no último dia de Dezembro e que explode no primeiro de Janeiro; A véspera de Natal é tão esperada, tão vivida, mais que o próprio dia natalino, aquele dia em que nasceu o tal menino Jesus na manjedoura, daquela antiga e bela história católica romana. Esses dias são cobertos de uma esperança renovada, talvez porque estejam bem guardados quase no fim dos 365 dias do ano. É quase como uma última esperança.
Acordo às 10 da manhã, meu rosto não está no clima do dia 24 de Dezembro, meus cabelos estão rebeldes, minhas unhas não estão feitas. E na rua, ao primeiro passo fora de casa- Casa vazia, todos estão se “aplumando” pelos salões de beleza ou comprando presentes- um cheiro de doce, de fatia parida e um ar de solidão.
Eu caminho só até a padaria mais próxima e compro um brigadeiro "Premium-gigante”, para ser meu café da manhã e o ânimo para um dia mais doce.
Pessoas conhecidas do bairro passam com suas imensas sacolas, com sorrisos imensos e sem mais nenhum tostão no bolso. Aí é que a gente reconhece mais ainda que Dezembro é um mês diferente: se gasta com vontade e por amor ao menino Jesus, é claro. Ele, tadinho, nunca mais ganhou nada de concreto desde os presentes especiais dos Três Reis Magos. Ah, está todo mundo meio apertado mesmo.
Esse ano, eu por exemplo, não presenteei muita gente, a não ser com sorrisos verdadeiros. As moças das lojas, não muito felizes com aqueles gorros quentes no calor de Belém, resmungavam o horário que teriam que trabalhar bem no dia de Natal.
Ah, o especial dia de Natal. Eu dou um sorriso com minha compra em mãos, enquanto elas pensam: "Especial seria se ninguém trabalhasse nesse dia especial".
E logo depois, os patrões sorriem ao verem o saldo do caixa recheado com o dinheiro daqueles que sempre deixam a compra para a última hora.
Eu fui comprar uma blusa nova para a reunião tradicional na casa das minhas amadas Tias-avós (um dia conto a história de cada uma delas aqui). Uma blusinha de trinta reais cabe no meu orçamento e no meu cartão de crédito.
Mas as enormes filas me enchem de preguiça e tédio. Incrível como na fila a felicidade que você estava ao encontrar aquela roupa perfeita, vai se esvaindo a cada minuto que a sua vez demora a chegar.
E ainda tem mais: A pessoa de trás sempre repara se o que você está carregando é melhor do que o ela tem em mãos. Algumas, menos inibidas, até perguntam em qual prateleira você encontrou tão sublime vestimenta, e você, no auge do seu espírito natalino, de amor ao próximo, é obrigado a responder com sinceridade e boa vontade, onde encontrou o seu tesouro.
Depois Jesus vai perdoar seus pensamentos mais sórdidos: Você torce para a pessoa não achar ou o modelo não lhe cair bem, ou ainda, em último caso, para não ir a mesma festa de confraternização que você. Afinal, trinta reais cabem no orçamento de quase todos os assalariados, e a sua blusa no fundo não é um tesouro, é normal, assim como o Natal e as promoções.
Então, depois de comprar a blusa, enfrentar a fila, driblar pessoas, ter cuidados para as sacolas não engatarem na escada rolante, você ainda enfrenta um último desafio: chegar em casa.
O trânsito em Belém do Pará não é, assim, digamos, uma coisa bem organizada. Nessa época então, até Papai Noel, se não souber domar suas Renas pelos caminhos certos, não entrega os presentes a tempo.
Ah, ainda tem mais um detalhe importante: Dezembro é um mês chuvoso, bem mais que os outros. Pode chover dias inteiros, noites inteiras...e claro, nos dois dias mais importantes do mês, a chuva têm que marcar presença e molhar os embrulhos.
Então como chegar em casa a tempo de se “aplumar” com tantos impecilhos ? Um táxi é claro, é o mais recomendável;
"-Calma, minha filha, é Natal, tudo é bonito, colorido e ao som de sininhos."
É o que ouço de um senhor sentado no ponto de táxi vazio bem na esquina da loja. Nenhum automóvel dava o ar da graça, os Táxis ficam tão concorridos quanto os Panettones de R$1,99 nessa época do ano.
A espera vendo os pingos da chuva não demorou muito: Avisto de longe, um ponto amarelo luminoso vindo lá no fim da rua larga. Era ele, o meu salvador, Táxi-trenó, prestes a me rapitar:
"-Boa noite. Governador José Malcher, entre Dr. Moraes e Piedade Por favor. Ah, Feliz Natal."
"-Boa noite, Feliz Natal."
Era seu Gilberto, que não tinha cara de Papai Noel. Ele tinha feito a barba, é Natal.
Com seu gorro azul marinho e branco, seu chaveiro pendurado no retrovisor com o símbolo do seu time do coração, o clube do Remo, seu Gilberto foi uma grande surpresa na minha véspera de Natal. O carro parecia flutuar, como eu imaginava nos meus sonhos de criança um trenó de Noel mesmo. E ele não tinha pressa para chegar, mesmo reclamando das costas fadigadas por aquele dia cheio de trabalho.
Falante, Seu Gilberto comenta que um dia deixaria essa vida de taxista:
"Quando ganhar na Sena, largo disso, caso com uma manicure daquelas bem doidas e vivo feliz para sempre..." E depois dá uma risada gostosa.
E o sonhos de riqueza eram acalentados pela trilha sonora do carro, que tocava Belchior:
"Deixemos de coisa e cuidemos da vida, se não chega a morte ou coisa parecida e nos arrasta moço sem termos visto a vida..."
Seu Gilberto me ensinou uma lição, bem maior do que qualquer história televisionada ou programa especial da Rede Globo. Ele me contou, em menos de 10 minutos de corrida, a história de uma velha senhora a qual ele tinha levado no seu Táxi-trenó, no mesmo dia: "Só cobrei a corrida porque era muito longe mesmo, moça, lá pras beiras de Icoraci...".
A senhora, segundo ele, era bem humilde, e tinha sido presenteada com uma cesta básica e uns brinquedos, pelos funcionários de um Salão de beleza próximo ao ponto de táxi onde ele fica. Chegando ao destino, a casa de madeira nas beiras de Icoraci, seu Gilberto disse ter visto a felicidade real do Natal:
"Moça, você tinha que ver o sorriso das crianças quando viram a comida, coisa bonita mesmo...A gente têm que dar graças a Deus todos os dias pela comida na mesa."
E ele terminou a história assim, sem reclamar mais das dores nas costas nem do trabalho. Nem tive tempo de olhar para os seus olhos. Os meus estavam embaçados como o vidro do Siena de quatro portas. Eu pedi o seu cartão de contato, desejei mais uma vez Feliz Natal e desci do carro, correndo feito Biju da chuva que banhava Belém.
O acalanto dos 10 minutos no Táxi-trenó foi a pitada daquela esperança derradeira que falei no ínicio. E depois tudo voltou a seguir seu clima vermelho, verde e tradicional:
A Menina Maniva vestiu a blusa de trinta reais, comeu Peru e torta de Chocolate, agradecendo ao menino Jesus pela fartura. E ainda ganhou uma agenda para anotar os sonhos de 2008 e o número do seu Gilberto, para quem sabe, um próximo resgate nos dias de pouca humanidade e chuva.
Sim, porque neles existem presentes reais, materiais, diferente da perspectiva de felicidade e sucesso em um ano novo, que é uma alegria quase forçada, esmagada no último dia de Dezembro e que explode no primeiro de Janeiro; A véspera de Natal é tão esperada, tão vivida, mais que o próprio dia natalino, aquele dia em que nasceu o tal menino Jesus na manjedoura, daquela antiga e bela história católica romana. Esses dias são cobertos de uma esperança renovada, talvez porque estejam bem guardados quase no fim dos 365 dias do ano. É quase como uma última esperança.
Acordo às 10 da manhã, meu rosto não está no clima do dia 24 de Dezembro, meus cabelos estão rebeldes, minhas unhas não estão feitas. E na rua, ao primeiro passo fora de casa- Casa vazia, todos estão se “aplumando” pelos salões de beleza ou comprando presentes- um cheiro de doce, de fatia parida e um ar de solidão.
Eu caminho só até a padaria mais próxima e compro um brigadeiro "Premium-gigante”, para ser meu café da manhã e o ânimo para um dia mais doce.
Pessoas conhecidas do bairro passam com suas imensas sacolas, com sorrisos imensos e sem mais nenhum tostão no bolso. Aí é que a gente reconhece mais ainda que Dezembro é um mês diferente: se gasta com vontade e por amor ao menino Jesus, é claro. Ele, tadinho, nunca mais ganhou nada de concreto desde os presentes especiais dos Três Reis Magos. Ah, está todo mundo meio apertado mesmo.
Esse ano, eu por exemplo, não presenteei muita gente, a não ser com sorrisos verdadeiros. As moças das lojas, não muito felizes com aqueles gorros quentes no calor de Belém, resmungavam o horário que teriam que trabalhar bem no dia de Natal.
Ah, o especial dia de Natal. Eu dou um sorriso com minha compra em mãos, enquanto elas pensam: "Especial seria se ninguém trabalhasse nesse dia especial".
E logo depois, os patrões sorriem ao verem o saldo do caixa recheado com o dinheiro daqueles que sempre deixam a compra para a última hora.
Eu fui comprar uma blusa nova para a reunião tradicional na casa das minhas amadas Tias-avós (um dia conto a história de cada uma delas aqui). Uma blusinha de trinta reais cabe no meu orçamento e no meu cartão de crédito.
Mas as enormes filas me enchem de preguiça e tédio. Incrível como na fila a felicidade que você estava ao encontrar aquela roupa perfeita, vai se esvaindo a cada minuto que a sua vez demora a chegar.
E ainda tem mais: A pessoa de trás sempre repara se o que você está carregando é melhor do que o ela tem em mãos. Algumas, menos inibidas, até perguntam em qual prateleira você encontrou tão sublime vestimenta, e você, no auge do seu espírito natalino, de amor ao próximo, é obrigado a responder com sinceridade e boa vontade, onde encontrou o seu tesouro.
Depois Jesus vai perdoar seus pensamentos mais sórdidos: Você torce para a pessoa não achar ou o modelo não lhe cair bem, ou ainda, em último caso, para não ir a mesma festa de confraternização que você. Afinal, trinta reais cabem no orçamento de quase todos os assalariados, e a sua blusa no fundo não é um tesouro, é normal, assim como o Natal e as promoções.
Então, depois de comprar a blusa, enfrentar a fila, driblar pessoas, ter cuidados para as sacolas não engatarem na escada rolante, você ainda enfrenta um último desafio: chegar em casa.
O trânsito em Belém do Pará não é, assim, digamos, uma coisa bem organizada. Nessa época então, até Papai Noel, se não souber domar suas Renas pelos caminhos certos, não entrega os presentes a tempo.
Ah, ainda tem mais um detalhe importante: Dezembro é um mês chuvoso, bem mais que os outros. Pode chover dias inteiros, noites inteiras...e claro, nos dois dias mais importantes do mês, a chuva têm que marcar presença e molhar os embrulhos.
Então como chegar em casa a tempo de se “aplumar” com tantos impecilhos ? Um táxi é claro, é o mais recomendável;
"-Calma, minha filha, é Natal, tudo é bonito, colorido e ao som de sininhos."
É o que ouço de um senhor sentado no ponto de táxi vazio bem na esquina da loja. Nenhum automóvel dava o ar da graça, os Táxis ficam tão concorridos quanto os Panettones de R$1,99 nessa época do ano.
A espera vendo os pingos da chuva não demorou muito: Avisto de longe, um ponto amarelo luminoso vindo lá no fim da rua larga. Era ele, o meu salvador, Táxi-trenó, prestes a me rapitar:
"-Boa noite. Governador José Malcher, entre Dr. Moraes e Piedade Por favor. Ah, Feliz Natal."
"-Boa noite, Feliz Natal."
Era seu Gilberto, que não tinha cara de Papai Noel. Ele tinha feito a barba, é Natal.
Com seu gorro azul marinho e branco, seu chaveiro pendurado no retrovisor com o símbolo do seu time do coração, o clube do Remo, seu Gilberto foi uma grande surpresa na minha véspera de Natal. O carro parecia flutuar, como eu imaginava nos meus sonhos de criança um trenó de Noel mesmo. E ele não tinha pressa para chegar, mesmo reclamando das costas fadigadas por aquele dia cheio de trabalho.
Falante, Seu Gilberto comenta que um dia deixaria essa vida de taxista:
"Quando ganhar na Sena, largo disso, caso com uma manicure daquelas bem doidas e vivo feliz para sempre..." E depois dá uma risada gostosa.
E o sonhos de riqueza eram acalentados pela trilha sonora do carro, que tocava Belchior:
"Deixemos de coisa e cuidemos da vida, se não chega a morte ou coisa parecida e nos arrasta moço sem termos visto a vida..."
Seu Gilberto me ensinou uma lição, bem maior do que qualquer história televisionada ou programa especial da Rede Globo. Ele me contou, em menos de 10 minutos de corrida, a história de uma velha senhora a qual ele tinha levado no seu Táxi-trenó, no mesmo dia: "Só cobrei a corrida porque era muito longe mesmo, moça, lá pras beiras de Icoraci...".
A senhora, segundo ele, era bem humilde, e tinha sido presenteada com uma cesta básica e uns brinquedos, pelos funcionários de um Salão de beleza próximo ao ponto de táxi onde ele fica. Chegando ao destino, a casa de madeira nas beiras de Icoraci, seu Gilberto disse ter visto a felicidade real do Natal:
"Moça, você tinha que ver o sorriso das crianças quando viram a comida, coisa bonita mesmo...A gente têm que dar graças a Deus todos os dias pela comida na mesa."
E ele terminou a história assim, sem reclamar mais das dores nas costas nem do trabalho. Nem tive tempo de olhar para os seus olhos. Os meus estavam embaçados como o vidro do Siena de quatro portas. Eu pedi o seu cartão de contato, desejei mais uma vez Feliz Natal e desci do carro, correndo feito Biju da chuva que banhava Belém.
O acalanto dos 10 minutos no Táxi-trenó foi a pitada daquela esperança derradeira que falei no ínicio. E depois tudo voltou a seguir seu clima vermelho, verde e tradicional:
A Menina Maniva vestiu a blusa de trinta reais, comeu Peru e torta de Chocolate, agradecendo ao menino Jesus pela fartura. E ainda ganhou uma agenda para anotar os sonhos de 2008 e o número do seu Gilberto, para quem sabe, um próximo resgate nos dias de pouca humanidade e chuva.
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